segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Desconhecer

O que ficou e o desengano o absoluto deserto toda a loucura a dor isso será um segredo não contarei então pode ser que um dia na curva dos meus olhos tudo deixe de ser o que foi. O grande medo é saber que mesmo depois de muito irá voltar a doer e que não se esquece não se esquece tudo o resto fica escondido. Não vale a pena dizer que ainda há tempo quando já não há tempo esta é a minha história há-de ser a minha história sei isso como sei os dedos dos meus pés e todas as vezes que procurei alguém no espelho do retrovisor. É isto e eu sei disto por isso não quero tudo isso que me contam. Eu sei.. Eu sei. Eu sei. Queria tanto não saber.

28

Eu sei e ainda assim vou. E, depois, no regresso, há que pagar todos os dessonhos.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Não sei fazer bolos

A minha cozinha é um sítio que me conhece descasco as batatas e choro para dentro da panela. Com a barriga encostada ao lava louça penso como fizeste avó como fizeste o jantar todos os dias com o coração a doer o medo a vida ao contrário? Como fizeste avó? A minha cozinha conhece todos os meus falhanços.

sábado, 22 de novembro de 2014

o amor é

o amor é bruto tem um cinto nas mãos o amor é torto tropeça e não me deixa dormir à noite o amor é velho e não me deixa fazer barulho o amor é rico e eu só uso roupa em segunda mão o amor é normal e eu sou estranha e penso difícil e preciso de imaginar o pior para que quando tu não vieres eu não morrer tu me bateres eu não morrer tu num caixão eu não morrer tu e a agulha eu não morrer tu o veneno para ratos eu não morrer tu a odiares-me eu não morrer tu tu tu. o amor.

Nunca é para sempre

Que tudo desapareça. Porque eu lembro-me de tudo. São como homenzinhos com picaretas na minha cabeça e no meu coração imagens que se repetem e repetem uns pés umas pernas uma camisa preta o café a rua as árvores em frente o Verão um vestido branco dias e dias e dias e dias e dias e dias. Tem de desaparecer. Os meses não acabam é uma loucura não sei como conseguem, os outros, continuar a caminhar. O medo e as dúvidas as certezas. As certezas. Que desapareçam os copos de cerveja e as noites as músicas que não sei os lençóis azuis escuros e os outros. a cozinha a tábua de alumínio onde se corta o pão a torradeira o meu coração partido o quarto ao lado o quarto ao fundo as mesas do café. Que morra que acabe que seja tudo há tanto tempo há tanto tempo e é agora. Que terminem os pesadelos deixa-me descansar deixa-me descansar deixa-me descansar.

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Dessentir

Não sinto nada. É isto, não sinto nada. As coisas mundanas e até os livros as séries e os filmes as conversas, não sinto nada. Sentam-se e levantam-se continuo sem sentir nada. Tenho pena de não saber compor música porque preciso de outra coisa para além de palavras um grito fininho, não não, um sussurro, uma campainha em fundo, um piano e o silêncio muitas vezes e depois se calhar outra vez o silêncio. Não sinto nada e, por isso, não sei dizer nada.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Menina

Amava-o. Houve um dia em que no meio do círculo da dor e da raiva, esperava por ele. Ouvi a chave na porta. O meu nome era esperança e certeza. Não sei se o que percebi primeiro foram os passos trôpegos ou o olhar vazio. Era ele e não era ele. Em vez de me salvar, como eu esperava, empurrou-me para o centro do círculo. Hoje senti o mesmo. Achava que quando crescíamos, o horror terminava. Fui uma menina.

sábado, 8 de novembro de 2014

?

Descobri, ontem, que tens razão. Já andava a concordar contigo, sem te dizer ou me dizer, mas ontem percebi que não sou doce que me esqueci de como é ser isso não sei bem porquê mas incomoda-me um bocado acharem que sou assim porque me fizeram mal fizeram-me mal? Sei lá. O que é isso do Mal ou Bem, o que é ser doce, o que é que eu faço de tão estranho digo coisas normais eu acho que são normais as pessoas acham piada ficam a olhar para mim espantadas e eu não percebo juro que não percebo ficam confundidas e eu gostava de vos dizer que vocês, são vocês que me confundem.

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Até ao fim.

Às vezes tenho medo que se alguém olhar para dentro dos meus olhos te veja a ti e ao teu riso e eu devia ficar feliz com isso não é o que dizem vamos guardar as coisas boas não quero que estejas dentro dos meus olhos em lado algum antes conseguias juntar todos os bocados agora só quero discutir contigo tenho esperança que os meus gritos acabem com o resto e nunca acabam. Só sei lutar.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Sempre, não.

E não haver um sitio ermo onde se possa gritar.

domingo, 19 de outubro de 2014

Mesmo que não venha mais ninguém, ficamos só...

Deixa-me ficar um bocadinho chateada contigo. Assim não podem existir muitas saudades. O dia a ficar mais claro quando me acordavas de manhã. Os nossos risos juntos contra a vida que consegue ser uma cabra. Agora, entraste tu no comboio e eu nem sequer me posso despedir de ti. Posso e não posso. Quero contar-te coisas - tenho tanto para te contar, para te dizer. Tens tanto para me contar e para me dizer. O mar era tão imenso e eu nem o consegui olhar. Tu estavas do lado do rio e eu do lado do mar. Foi sempre assim porquê? Estou tão farta de saudades e de impossibilidades. Acho que contigo eu era qualquer coisa de que me tinha esquecido. E, sabes, já não me lembro. Porque tive de me chatear um bocadinho. Para te dizer um adeus estúpido e doente. a vida, que consegue ser uma cabra. Já te tinha dito? Houve alguém, um dia, que decidiu que eu teria uma armadura de ferro. Então, a minha força seria um talento. Quero ser fraca como toda a gente. Mais fraca ainda. Não consigo. Então, chateio-me um bocadinho e não te digo que tenho saudades. E pena. Muita pena.

sábado, 4 de outubro de 2014

Continuar

Aparece aí, serve dois copos, não me dói nada. Não me apetece ouvir-te, deixa-me só fechar os olhos. De manhã, não vou acordar para me despedir. Mas, obrigada.

Abraço-os

Hoje a lua está cortada ao meio e eu meia volta dei. Soube tão bem, sonhar. Era tão bom, acreditar. Aqui neste canto neste lado da rua existem fantasmas e eu gosto de dançar. Então danço. A noite é muito longa, como já te disse, e eu tenho muitos demónios também. Este veneno que herdei e que alimento. É uma defesa, tu sabes. Enquanto não vens tu de ti outro de ti alguém assim que me olhe para lá das confusões e dos medos eu beberei a vida como um copo de shot. Então, meio anestesiada, acordarei a saber que o céu ainda não é profundamente azul e que os meus caminhos serão sempre duros. Abraço-os, como sempre. E afago os demónios que me rosnam aos pés. Hei-de amansá-los e um dia seremos os melhores amigos.

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

É tarde

O que fazem todos vocês à noite? Escrevem cartas? Aninham-se? Discutem? Esquecem? As noites não são para dormir, nunca foram, não percebo esta sede de aproveitar as manhãs, o mundo é muito confuso às nove e eu fico sempre mais frágil ao acordar. Nunca percebi se as noites são dos felizes ou dos infelizes.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Está tudo bem.

A tua falta é como se menos um lugar à mesa uma fotografia que temos de esconder para não doer um perfume que não usamos porque nos lembra. Mas as saudades de ti são bonitas como tudo. Sabias?

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Não te esqueças porque eu não me esqueço

Tu tiveste o Verão. Eu não.

É

Às vezes, lembro-me. É como um segredo demasiado tudo que não sei. Nem posso.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Outono

De repente o mundo calou-se. Na manhã cinzenta os carros as horas e tudo passou como se voasse, como se o Verão tivesse sido há muito tempo e eu já soubesse todas as lições. Saberei?

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Promete

Quando tu passavas, eu, que sabia nada de nada, sabia isto: os teus passos certos no chão, a forma como o teu olhar mais cinzento que azul se demorava nas coisas. Todos te viam o azul dos olhos, menos eu. Em ti sempre houve mais cinzento, todas essas coisas que te travam e te fecham esses muros e essas ruínas que tu não sabes de onde chegam. Eu sabia. Não me perguntes como eu sabia. Depois, houve um dia em que me sentei no teu colo e ouvi-te falar de coisas que não falavas e apesar do rio e da luz que explodia no céu eu sabia, de novo, que nunca tinha estado tão certa. Quero dizer-te: "Não me deixes aqui a saber de ti, de novo, sem poder alcançar". Mas, se assim tiver de ser, promete-me que não ficarás com menos do que amor.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Seis

Disseste que morreu acorda-o não morreu nada foi só depois exactamente como quando se morre Não não espera ainda não deixa-me só estar mais um bocadinho agora não que o meu vizinho é louco agora não que ainda ontem me disseste que gostavas das minhas pernas e de como o meu cabelo estava bonito agora não que eu preciso de gostar de ti para saber que nem tudo se perdeu. Mas, como eu não sabia, tu és tu e eu sou eu, afinal não éramos, a história estava escrita algures e eu queria só mais um bocadinho de tudo e talvez para sempre. Nunca mais é tanto tempo não é? Custa-me deixar-te para trás mas entretanto não me convidaste para jantar. Não sei onde estás. Eu estou bem. O meu vizinho continua louco o meu cabelo igual e as minhas pernas estão apenas um bocadinho mais magras.

Amanhã faço anos.

36.

6. Seis. Lembras-te do "Verdade ou Veneno?". A verdade era o veneno.


segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Não.

Ei, tu não sabes nada sobre o amor. Não é uma ideia, não te apanha a meio do caminho, não é um autocarro, não é nada daquilo que inventaste para ti. Vais ter de contar com toda a tua coragem e, mesmo tolhido de medo, saltar. O amor é uma certeza. Tantas vezes estúpida. Lembra-te "o amor é uma coisa, a vida é outra". Há quase ternura em mim pela tua busca. Mas não.

Prova de esforço

Largar o coração, deixá-lo estar, parar, não quero agora não quero também não posso é demasiado. Virar a cabeça uma e duas as vezes todas acordar e beber dois cafés. Matar o que não sei antes de saber. Não posso deixa-me estar. Não quero, deixa-me estar. Tenho tudo a perder. Largar o coração, voltar à tona e respirar.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Fiquem perto

Vão ter de me perdoar os demónios que me acompanham e, mesmo sem entenderem, continuarem aqui. Porque sabem de mim isto que sou e que fui, mas não se sentaram comigo no portão. Não viram o que eu vi. Eu sei de tudo isso, mas não posso. O resto fui eu, sozinha. Disse-vos tantas vezes: "Vão". Ainda que a razão e tudo o mais fosse uma seta apontada para lado algum. Espero que continuem aqui, ou então este lugar será tão mais solitário. E vocês fazem-me falta. Mas... vocês não se sentaram comigo no portão. Não sabem disto como eu sei. Fiquem perto.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Interior

Nem flores nem noites ou ombros nada mais para vos dar. Vejo-os a todos, aos meus fantasmas. Caminham nos meus sonhos e trazem-me notícias tristes. Mostram-me o medo. Partiram todos.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Na rua

O pior é que conseguimos tudo, morremos da cura e da salvação. Não morremos de amor nem de ternura ou de êxtase ou de tristeza. Morremos ao ficarmos bons. E isto custa. Dá comichão e queremos arrancar a crosta e sabemos que tudo é ridículo que tudo será sempre assim tão simples. É a simplicidade das coisas que nos custam que nos baralha.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Germana

O meu tudo e o meu todo o meu Norte cego e a minha noite doida as minhas ruas em luz e o meu corpo perfeito o meu tudo e o meu todo. A minha recompensa a moldura na sala o amor ao peito. O meu tudo e o meu todo. As músicas os filmes os olhos em fundo. Não era nada disto. O meu tudo e o meu todo.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Espera por mim

Espero pelo Verão como quem espera por um amor que vai descer do comboio. E eu que adoro o Verão tudo isto nunca tenho um Verão feliz. Não sei, já não me apetece mergulhar na memória, tenho medo, mas se todas as estações do ano me doeram por esta ou aquela razão, tendo a nítida sensação que foi nessa nesta altura que fui mais infeliz. Não é por gostar da praia, nem das noites imensas nem do sol a queimar-me a pele eu igual por dentro é por fora. O Verão deveria ser todas as possibilidades, mas é sempre o meu vestido apenas a esconder o mais perdido dos corações.

terça-feira, 20 de maio de 2014

Entre o medo

Escolho o orgulho em vez do medo. Filho, para que saibas, tenho tido medo. Dentro de mim, naquele fundo que somos nós ainda tu dentro da minha barriga e eu a conhecer-te inteiro, aí dentro, eu sei que tu deves estar certo. Que não é por mal. Tenho medo por ti. Não acabas os testes, não entendes a importância de testar coisas que alguém inventou para testar gente grande e são os miúdos como tu que vivem no fio da navalha. Tu não te cortas. Passas por cima ou por baixo e perdoas-me ser a mãe que eles querem que eu seja. Perdoas-me tudo, apesar de injusto. E percebes que é por amor. Escolho o orgulho em vez do medo.

terça-feira, 15 de abril de 2014

montanha russa

Se eu pudesse sentir menos, saber menos, ter visto menos. Se tudo o que vejo durasse apenas o momento inteiro e não fosse preciso a minha alma desatar-se dos dias uma e outra vez.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

nunca menos

Porque a vida dizem que é isto a mãe está a trabalhar é bom assim sempre descansa e o miúdo está na avó mimo brincadeira amor também. a saudade não obedece a coisas racionais férias calendário a saudade é igual sempre. um medo permanente de perder um vazio qualquer menos profundo quando dizemos, a um mesmo tempo, pelo telefone, amo-te.

sábado, 22 de março de 2014

Manhã cedo

Hoje acordei com o teu rosto Toda a noite esteve comigo E acordei cedo O teu rosto era triste E o meu coração doía Queria explicar-te muitas coisas E deixar-te chorar no meu colo Tens cabelos brancos agora E o tempo passou também por nós É uma afronta O tempo não deveria passar por gente como nós Precisamos de tempo Sinto falta das tuas mãos tão quentes E vejo-te sozinho Mergulhado na dor que reconheço. Hoje acordei com o teu rosto Levo-o comigo E afago-o Não tenho palavras para ti Ou promessas Há muito que me desacreditaste Levo-o no coração e na alma Tão puros E afago-te levemente o rosto E espero que quando acordares Te recordes vagamente de um sonho Em que eu te afagava o rosto E te levava comigo Em paz.

terça-feira, 11 de março de 2014

Março

Ei, conheço-te há tanto tempo sabes, antes de ter visto. E tu, tu igual. Agora que estamos velhos e já fizemos tudo, podíamos brincar à vida real e aceitar aquilo que é. Amor.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Triste tristeza

Quanto tempo dura a tristeza? Quanto tempo, quanto tempo? E se ficamos nela para sempre como aquelas mulheres de negro como as velhas nas janelas como as pessoas que deixaram de ser bonitas de um dia para o outro? Tenho tanto medo. Nunca fui tão triste nem durante tanto tempo. Eu achava que nem sabia ser triste ninguém sabia que eu podia ser triste assim. Quanto tempo quanto tempo quanto tempo?

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Guerra fria

Os exércitos marcham em direcção ao futuro, que saberão eles que eu não sei? O que viram eles, que eu não tenha visto? Marcham numa cadência impossível com palavras que lhes ensinaram as mães sem rugas - ainda não tinham rugas e deviam ser felizes. Exércitos inteiros, com palavras e destinos que eu não sei imaginar ou sonhar e segredos. Eles têm segredos? Têm. E esquecem-me.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

saudades

de nadar de ter a certeza de tantas pessoas. Do comboio de revistas e livros no café de mim. de vestidos bonitos e sapatos vermelhos de regueifa broa de milho cevada. de ti pai TANTAS. do jornal da auto-estrada de roupa passada e de rua de esperança. de não ter medo de uma agenda de filmes para ver de cerejas de verão sem doer de calças largas na cintura de terra do Alentejo de mim de ter a certeza. Saudades.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Depois

Sabes quantas vezes escrevi o teu nome? (ainda escrevo o teu nome) Segui pelo caminho para lá da esperança, saltei o muro (tenho medo). Tu, ris. Pela manhã, tu ris. Gostava de rir contigo, mas não posso rir muito, rir de tudo ou esquecer. Escrevi o teu nome em mais de mil dias, foram mais, muitos mais e tu ris, pela manhã, como um pássaro sozinho.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Ouve

Voltaremos a deixar cair os isqueiros?

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

anybody seen my baby

2009

Vou tatuar-te no pulso onde as veias se cortam mais fácil vou tatuar-te na carne que me deste, prender-te na minha pele, dar-te lugar em mim. Vou pedir que me encham os poros de tinta com o nome maior que tu tens que tu és que me encham este lugar vazio e pode ser que não me custe tanto ter deixado de dizer Pai.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Autópsia

Respiro muito devagar ou tento respirar até ao fundo a preparar-me antes da queda, por isso sei que ficaste com os meus pulmões. O olho esquerdo treme, julgo que treinei tão bem as mãos e o corpo para que ninguém soubesse o momento em que me desfaço, que o meu olho esquerdo decidiu acabar com o fingimento. Treme tanto, por isso sei que ficaste com os meus olhos. Fazia arroz de tomate e gostava de partir a salsa muito pequena era um bocadinho feliz um bocadinho crente e tinha fome. Nunca mais tive fome, por isso sei que ficaste com o meu estômago. Tento ouvir músicas novas e todas elas se misturam no mesmo ritmo e som como se só conseguisse ouvir o eco fundo dos meus passos sozinhos. Também os meus ouvidos? Podia falar-te dos meus pés (nunca mais pintei as unhas) ou dos meus lábios (esqueci-me do desenho), do meu peito e pernas, escondidas as curvas de um outro tempo, porque, se não as vejo, não me lembro do tanto. Devolve-me.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Quieta

Deixa-me ficar aqui na minha quietude tresloucada, deixa-me ser a pior e a cruz, deixa-me estar deixa-me estar. Ontem havia uma folha, uma única folha, agarrada aos ramos nus de uma árvore. Essa folha era tão ridícula e tão bela. Fecha-me os olhos para eu não ver já não quero sinceridade nem verdade quero-me a mim sossegada quero ser quem eu sou. Parece tão fácil: ser quem eu sou. Mas isto só para quem nunca se viu apontado a si mesmo, como um punhal de carne que é afinal a nossa própria mão. Deixa-me ser o meu riso e a minha história, deixa-me ser grande e estranha, deixa-me estar deixa-me estar. Que eu quero-me como nunca me quis, que eu quero de volta as minhas pernas e o meu peito, que eu preciso de mim. Devolve-me. E deixa-me estar.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Dias maiores

Como é que és capaz de não compreender, diz-me, normalmente isto acontece por coisas como de facto não compreender. É lixado. De repente, levanta-se um tornado, roubaram-lhe a mãe, mataram-lhe o gato, pelo caminho devo ter destruído um país e rasgado a bandeira do clube de futebol. As pessoas na rua ficam transtornadas algo de grave se passa deitei-me com o irmão ou vendi as jóias de família. Há dias, com o coração mais em baixo (são muitos, por razões várias, normalmente distantes desta merda toda), em que baixamos os olhos, ouvimos para não perder. No fim, perdemos sempre. Espero que o Verão chegue rápido, preciso de beber cervejas na rua e de usar vestidos de algodão.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

todos os medos

No mês de todos os medos choveu sempre. Em mim, a tempestade. À noite, as canções de embalar eram como riscos num vidro perfeito. Queria ter muitas palavras e não tinha muitas palavras. Li tanto e baralhei o destino. No mês de todos os medos. A comida esteve sempre salgada ou falhei a salsa. Choveu sempre, mesmo quando parecia que ia fazer sol. Atravessei a chuva e a cidade. Não sei como fiquei.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Nada

Cuida de ti cuidamos falta-nos muito olha bem e cuida de ti cuidamos as janelas já não abrem a rua é triste os cafés amargos a noite imensa e nós pequenos tão pequenos pequeninos. Cuida de ti cuida de ti cuida de ti. O chão tem migalhas a cortina é a mesma e o resto nada.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Ouve

Capitão, capitão, não tenho medo de morrer, desde que me tragas os olhos ciganos do meu primeiro amor e a primeira vez que senti um filho. Leva-me ao colo do meu pai e devolve-me uma tardinha morna em que esperava pela minha mãe. O dia em que ela chegou. Capitão, eu não tenho medo de morrer, desde que me tragas o muro onde escrevi datas de esperança e o blusão preto que me fez feliz a cabine telefónica a camisa de dormir verde com flores e o primeiro dia de tudo. Capitão, que o último seja outra vez o primeiro. E eu vou.

Tatuagem

Aquele exacto sítio, o café o barulho o vestido pendurado eu a gostar de vestidos a esperança lembras-te? Lembro-me. Na rua, os semáforos ficavam sempre verdes e continuava a ser tudo difícil. Mas. Um coração tão cheio continuar depois do vidro partido acreditar acreditar. Cantávamos. Gente e mais gente. O vinho era barato e então? E então. Bonito como deixou de ser. A calçada as coisas a resolver tudo se resolvia até apanhei um avião. Fui eu quem mudou. Apenas eu.

Laura

You say, that they’ve all left you behind Your heart broke when the party died Drape your arms around me and softly say Can we dance upon the tables again? When your smile is so wide and your heels are so high You can’t cry, put your glad rags on And let’s sing along To that lonely song you’re the train that crashed my heart You’re the glitter in the dark Uh, Laura you’re more than a superstar And in this horror show I’ve got to tell you so Uh Laura you’re more than a superstar You say that you’re stuck in a pale blue dream And your tears feel hot on my bed sheets Drape your arms around me and softly say Can we dance upon the tables again? When your smile is so wide and your heels are so high You can’t cry put your glad rags on and let’s sing along. To that lonely song You’re the train that crashed my heart You’re the glitter in the dark Uh, Laura you’re more than a superstar You’ll be famous for longer then them Your name is tattooed on every boy’s skin Uh, Laura you’re more than a superstar you’re the train that crashed my heart You’re the glitter in the dark Uh, Laura you’re more than a suṗerstar And in this old horror show I’ve got to let you know Uh Laura you’re more than a superstar

domingo, 19 de janeiro de 2014

Domingo

Quando eu ando as minhas pernas têm muitos anos em todas as esquinas a desilusão. O miúdo olha as estrelas e pedimos os dois coisas impossíveis IMPOSSÍVEIS não doer tanto, ser tudo quando tudo podia ser ou então não saber de nada. "Aguenta", diz a criança. Com as pernas como mundos ingratos os olhos como rios de lodo as nódoas negras nas estradas e no meu sofá. Queria entender a razão de ser das coisas porque uns assim são e outros não, é como não entender a morte de inocentes. Ontem hoje ontem amanhã sempre uma tatuagem eterna. A comida desce como se não entendesse também ainda assim lavei a loiça e isso sabem lá é uma vitória do outro lado não sei. Deste lado, na minha rua, a minha ingenuidade é uma bandeira rasgada é por isso que pintei o cabelo de negro. Lembra-me de quando eu acreditava em cabelo negro em coisas bonitas quando o mundo parecia quase perfeito e eu nele tinha um lugar. Desculpem pessoas, como tu, doce M., que já me levaste ao colo nesta história, nas minhas palavras nas minhas ausências. Sabem lá, eu não sei dizer, não quero contar para não ser apenas mais uma história. Esta é a minha história. Feia e vulgar bela e gigante como todas as de palácio e as de casebre. Mas eu não fiz batota. Eu nunca fiz batota. Foi por isso que perdi?

Demasiado

Eu tinha um sonho. Era um sonho bonito. Foi muito estúpido durante demasiado tempo. Demasiado. Esta palavra em tudo. Demasiado tempo, demasiado bom, demasiado mau, demasiado torto, demasiado impossível. Virei-me ao contrário demasiado e demasiadas vezes. Era um sonho e comandou a minha vida como o homem canta. Tirou-me tudo este sonho demasiadas coisas durante demasiado tempo demasiada crença demasiada dor demasiados dias maus demasiada esperança demasiadas lágrimas demasiado contra mim. Este sonho era bonito. A vida é feia. Os actos das pessoas são feios. Só o sonho é bonito. Demasiado bonito.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

MUTE

a música.

Para sempre

Nada de três dias. Uma eternidade.

Espantalho

Foda-se, não tenho mais desculpas. Passou muito tempo. As que usava ficaram gastas espantadas a olhar para mim a rirem delas próprias. Tenho medo de ser um espantalho carregado de pássaros. Não há mais desculpas. Como nos defendo agora? O que era há tanto, tanto tempo, continua a ser. Até o que parecia não mais voltar, voltou, neste momento, como se nada tivesse acontecido. Como te vou desculpar? Como me vou desculpar? O que foi tudo isto, afinal?

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Agora

Respiro. Respira. Respiro. Respira. Respiro. Quando eu partir para a guerra levo os olhos do meu filho. O meu coração. A lealdade. Os meus demónios. Se perder, os olhos do meu filho, o meu coração, a lealdade, sobreviverão aos meus demónios. E tu?

Afasta de mim esse cálice

Abria a garrafa de vinho. Era fácil. (Eu também podia abrir uma garrafa de vinho). É sempre fácil quando não há nada a perder. As minhas respostas não estão do outro lado da garrafa de vinho. Nem as tuas. Precisas assim tanto que alguém te diga que estás a fazer tudo bem? Estás a fazer tudo bem, pronto, já disse. Já passou? Não, pois não? Eu que já perdi (quase) tudo, sei. Abrimos uma garrafa de vinho, dizemos coisas bonitas, é tudo tão leve e idiota. Dentro de nós um vulcão por extinguir e, do outro lado, alguém que acredita que não existe lava que não existe medo que não existe (já) outra pessoa. Depois, alguém se ri das nossas piadas, passa a mãos nas nossas feridas, ainda devagar. Conta-nos coisas e é outra vida e por momentos (breves) acreditamos que pode ser que podemos abrir garrafas de vinho e sermos outros. Sim, eu podia abrir uma garrafa de vinho. Imagina isto: convidava os gritos que te gritei e a incompreensão de que me acusas. Bebíamos uma garrafa de vinho. Brindávamos até. Também se desonra uma história durante uma garrafa de vinho.

sábado, 11 de janeiro de 2014

O medo

O medo é uma cabra e uma puta. O medo faz-nos ser pequeninos e ousar nada. Normalmente são os mais medrosos que dizem de boca cheia que não têm medo de nada. Como eu. Se eu não tivesse medo não era tão egoísta e minúscula. Tem de chegar o dia em que olhamos para dentro de nós e nos permitimos deixar de foder a vida dos outros só porque somos uns bebés chorões cheios de certezas ridículas que sugam a bondade dos que têm mais que fazer. O medo é uma cabra e uma puta. E nós às vezes temos mesmo é de levar com um camião na tromba. Sem chorar.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Às vezes não

"O que escolhes é entregar-me o podre e o que nos minou numa bandeja de insensibilidade, como se escrevesses num muro a letras gordas más e infames tudo o que sempre nos afastou."