terça-feira, 31 de dezembro de 2013

"Os cavalos também se abatem"

É um romance negro. Do talento e crueldade com que, com grande facilidade, algumas pessoas podem transformar outras pessoas em não-pessoas. Mas, os cavalos também se abatem. 2014: tu não sabes ainda mas eu danço de olhos fechados e danço bem. Danço tão bem. Que comece a música.

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Nome feio

Estava ali sossegada. Soprei os balões e comprei uma corda azul com que os amarrei aos postes. O meu menino fazia anos e eu fazia a única coisa que sei fazer bem: amava-o. Quando tu chegaste eras apenas tu e eu sabia do caminho que tinha feito e das noites e dias necessários à minha ainda recente transformação. Era um fantasma tranquilo, mas de coração sossegado. Depois, achaste que podias derrubar a minha casa plantar conforto nos olhos da minha mãe semear ternura nos braços das minhas irmãs. Eu deixei. Não fiz por isso, mas deixei. À tardinha, o meu corpo doía e o meu coração também. De coisas que tu não sabias que eram a minha vida e que eu levaria para a frente. Olhaste para mim como sempre fizeste como coisa que te pertence como coisa que podes amar e odiar à velocidade da tua fraqueza. Quando saíste eu adormeci e o meu coração batia ao ritmo de sempre. Só bateu mais rápido agora, que destruíste tudo... por nada.

Perdedor

Desiste tu que eu não desisto. Não volto atrás todas estas cicatrizes a dor tamanha de todos os meus erros sou tudo isto é certo podes escrever aí na minha ficha que eu não desisto. Não troco aquilo em que acredito pelo mais fácil e confortável. Não troco a paixão de que sou feita nem o oceano dos meus pecados. Sou pecadora, mas sou livre. Vou ser sempre livre. Neste intervalo podias ter aprendido tudo sobre força. Esta é a minha força: nunca voltar atrás. Eu não volto atrás. Mesmo quando parece mais fácil. Seria. Viverei morta de cansaço retalhada das cicatrizes perdida na cidade encostada a muros a olhar os buracos que se abrem debaixo dos meus pés. Mas continuarei a ser eu. De mim, quem passar, não irá dizer: aquela que ali vai desistiu. Nunca o fiz, não o farei agora. E o amor, o único amor que importa que nos faz voar por cima de edifícios e temer a saudade da mesma forma que se teme a morte, esse amor claro e puro, esse amor verdade, irá, de novo, cair-me aos pés. Eu sei. Porque não desisto. Desiste tu. Talvez hoje, talvez já amanhã, nuns olhos grandes e cheios de possibilidades, num cheiro doce e ameno, na aventura mágica que é cair, cair de pé, ficar no chão, correr todas as ruas e ao longe gritar aquilo que mais se sente que é mais verdade que é o vulcão que ninguém nunca, por mais que tente, conseguirá alguma vez apagar.

domingo, 29 de dezembro de 2013

Pés de barro

Eu que te julgava tão grande e afinal isto. Queres curar o coração? Aceita. O amor que não pode ser. O amor que te entope o cérebro. O amor que é tudo menos essa dança manhosa que tu fazes. Não volto a dançar contigo. Eras o meu herói.

Intervalo

"Deus deveria recriar-me o mundo que não soube criar para eu ser nele todo e a minha solidão feliz". Vergílio Castelo, não sei se a tua mãe também vomitou quando te estava a dar à luz ou às trevas a minha mãe às vezes diz-me isso que vomitou uma coisa verde quando me estava a parir e olha para mim como se eu fosse um bicho estranho. Seria irónico se eu não fosse um bicho estranho. Acontece ficar triste porque a minha mãe é daquelas pessoas que não conseguem amar o que não compreendem. A minha mãe. Ontem estava a tirar sangue e queria chorar porque tenho medo eu que já fiz tanta porcaria que saltei de pontões que me apaixonei por pessoas perigosas tenho medo de coisas pequenas como se só esse medo me fosse permitido. A senhora de cabelo branco e casaco azul deu-me tantas festinhas nas pernas disse-me coisas e eu queria ter-lhe perguntado se ela podia ser minha mãe. O mais estúpido disto tudo é que já tenho idade para não ser medricas e carente ou para ter resolvido o terror do meu passado. Mas não. Assim como tu me podes dizer essas coisas que me esmagam a alma como se a culpa fosse minha como se eu não soubesse que é quase Janeiro e que foi num Janeiro assim que nos encontrámos. Entretanto as pessoas doces e certas estão de volta à tua vida e acho bem isto foi só um intervalo ainda que isto seja eu,o bicho estranho, que tu nunca entendeste.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

A sério?

Ano mau ano mau que parecias tão bom tenho mesmo de aprender tudo até ao fundo? Ano mau, enrolaste-me bem, quase que eras o regresso de mim, mas não és. Continuo com medo quero comer um Pai Natal de chocolate e gostar. Hoje, na estrada, percebi que me abanaste e cuspiste para o mesmo sítio e esqueci-me ano mau que quem eu amo está tão triste que quem eu devia proteger está tão triste ano mau, que bem que me enganaste ano mau. Sinto saudades do cheiro a perfume estamos todos a ficar pequeninos como naquele livro de Boris Vian. Tenho saudades do meu pai, de pão com chourição, e da minha avó. Tenho saudades das minhas gavetas pequenas e dos meus sonhos possíveis. Não faço nada bem.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Tarde

Disseste que era como as feridas que demoram mais tempo a sarar (alguém aqui comenta que ela ficou mais magra e eu gostava de desaparecer para debaixo de uma manta às vezes não consigo fingir nem um bocadinho) e eu não sei se é porque agora tenho 35 ou só porque antes tinha tempo. Preciso de tempo para saber. Não nos podem morrer amores ou sonhos e continuarmos a ouvir o despertador. Não podemos. Eu preciso de tempo e não tenho tempo algum. Dizem-me que não, dizem vai continua, mas é urgente parar ainda que mais nada pare. Sinto-me tantas vezes no meio da rua como se o ruído do mundo fosse a turbina de um avião e continuar a dizer bom dia e boa tarde ter de apertar as botas e usar um vestido (agora tenho de pensar no jantar e não posso, tenho outras coisas para fazer como ficar sossegada a perceber). Preciso de tempo para saber das coisas, tempo sem relógio ordem confusão noite e dia roupa lá fora segunda e sábado Natal e aniversários estou farta de calendários. Chega (e o miúdo sai às quatro). Porra.